Publicado Por Kátia Rejane - Comunicadora do Caatinga
Neste mês de junho, a equipe do
Caatinga participou de uma formação sobre divisão justa do trabalho. Vera
Guedes, educadora do Centro Nordestino de Medicina Popular e integrante da
coordenação da Articulação de Mulheres Brasileiras (AMB), facilitou o momento
de reflexão. Aproveitamos a oportunidade para conversar com ela. Na entrevista,
Vera Guedes reflete sobre como é possível construir relações mais igualitárias,
a partir da divisão justa do trabalho, nas relações familiares e de trabalho,
ela fala também sobre o contexto político que o Brasil vive atualmente.
Caatinga
– O que seria um mundo com um olhar feminista?
Vera Guedes – Eu acredito que um mundo feminista não é é um mundo de privilégios para as mulheres, é um mundo de justiça. E nesse mundo de justiça quando as coisas são divididas igualmente claro que todo mundo fica feliz. Você imagina se uma mulher pudesse dividir suas tarefas mais justamente como seu companheiro ou sua companheira, ela não teria mais tempo para se dedicar a essa relação? Ela não seria uma pessoa mais feliz? Ou se fosse o contrário, se o homem dividisse mais as tarefas com a sua companheira – eu estou colocando a tarefa doméstica porque é uma coisa que marca muito a desigualdade – também ele teria mais tempo para ficar com sua companheira. Então eu acredito que um mundo com um olhar feminista é um mundo mais igualitário.
Caatinga
– Como as organizações podem incorporar a questão da divisão justa do trabalho
para levar adiante na sua proposta de ação?
Vera
Guedes – Uma
das coisas que pode ajudar no pautar a divisão justa do trabalho é essa
tentativa que as organizações têm feito, que é fazer um planejamento coletivo
da responsabilidades. Não estou dizendo que tarefa diferença não possa ser uma
divisão justa, não é que eu tenho que fazer a mesma tarefa que a outra pessoa,
mas eu tenho que ter a mesma hora de trabalho e a mesma hora de lazer,
igualmente. E com essa hora eu posso fazer o que eu queira, eu possa decidir. E
para mim, pensar a divisão justa do trabalho é também as mulheres pensarem os
projetos, é também escrever o projeto, mas é também executá-lo na ponta. Sempre
fico observando quando a gente está em encontros, em oficinas e seminários e
montam-se grupos tem a segmentação das atividades, e vemos que a grande maioria
das mulheres vai produzir os cartazes. Esse é um exemplo, que as pessoas acham
que é iminentemente da mulher fazer os cartaz e não é. Pensar a
divisão justa do trabalho é também pensar as responsabilidades. E se a gente
pega o campo das organizações e dos movimentos sociais isso também ainda está
para construir.
Caatinga
– Os movimentos de mulheres sempre estiveram na construção da luta pelos
processos democráticos. Agora temos vivido um momento mais difícil no Brasil,
como você enxerga esse momento?
Vera
Guedes – Um
momento difícil. Momento que a cada dia a gente tem que repensar nossa forma de
luta e se reestruturar para enfrentar. Eu particularmente, que estou no
movimento há muito tempo, nunca imaginei viver um movimento tão conturbado
quanto esse. De perda de direitos, e isso é difícil porque é um fator que
desmobiliza. É um momento que a maioria da população não acredita na justiça,
então você não faz a luta pela justiça porque você não acredita nela. Então é
um momento de grandes enfrentamentos. O movimento de mulheres e o movimento
feminista tem feito grandes enfrentamentos. Mas a gente reconhece que mesmo
antes do golpe a gente já estava num momento difícil para os movimentos
sociais, pela própria composição do Congresso. Mas a gente tinha uma gestora
que olhava mais para a maioria da população, estava mais aberta para o diálogo
com os movimentos. O que com o golpe caiu por terra. Com esse governo que está
aí não é possível negociar. Existe uma retração de recursos e com isso é
mais difícil mobilizar as pessoas, o centro do poder está longe da maioria das
capitais. Tudo isso dificulta muito, mas eu acredito que a estratégia é
resistir e se juntar com outros movimentos, fazer frentes de luta e ir para
rua. Porque só assim que a gente pode reverter esse quadro. Não tem outro
jeito, não dá para a gente ficar dentro de casa ou dentro do nosso escritório
sem pensar tem tudo que tem a ver com o contexto.
Foto:
charlesaraujo.com.br
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